TJ contradiz Roseana Sarney sobre pagamento de precatórios no Estado

Deu no Jornal Nacional

O poder judiciário do Maranhão negou ter determinado o pagamento de uma dívida do governo estadual a uma construtora: um precatório. O Governo tem afirmado que o pagamento tinha sido ordenado pela Justiça.

O Tribunal de Justiça foi a público para contestar o governo do Maranhão. E esclarecer uma declaração dada pela governadora Roseana Sarney ao Jornal Nacional.

Na última terça-feira (5), a governadora negou ilegalidades no ree à construtora Constran. E disse que apenas cumpriu o que a Justiça determinou. “Nós só fizemos o que a Justiça mandou e com a anuência do Ministério Público. E decisão judicial a gente não discute, a gente cumpre”, disse Roseana Sarney.

Nesta quarta-feira (13), em nota oficial, o Tribunal de Justiça do Maranhão informou que não houve qualquer determinação para pagar o precatório da Constran. E que, desde setembro do ano ado, a dívida foi excluída da lista de pagamentos a pedido do Ministério Público.

Em novembro, o governo do Maranhão e a Constran fecharam um acordo extrajudicial para que a empresa recebesse R$ 113 milhões. O acordo foi homologado – ou seja, reconhecido pela Justiça. A governadora Roseana Sarney não quis gravar entrevista nesta quinta-feira (14).

Quem respondeu, no lugar dela, foi a Procuradoria-Geral do Estado, que declarou que essa homologação do acordo pode ser considerada uma decisão judicial.

O caso do pagamento à empresa Constran veio à tona depois do depoimento prestado à Polícia Federal por Meire Poza, que foi contadora do doleiro Alberto Youssef, um dos presos na Operação Lava-Jato.

A contadora disse que a construtora pediu que Youssef subornasse o governo do Maranhão, oferecendo R$ 6 milhões. Em troca, a empresa furaria a fila de pagamentos judiciais e receberia, antecipadamente, R$ 120 milhões.

Ainda segundo a contadora, por ter negociado o acordo, Youssef receberia R$ 12 milhões. Segundo o portal da transparência do governo do Maranhão, já foram liberados R$ 33 milhões desse precatório à Constran.

Nesta semana, o Ministério Público do Maranhão abriu investigação sobre as suspeitas. O prazo inicial de apuração é de 90 dias. Em outra frente, a juíza Luzia Neponucena, que suspendeu novos rees à Constran, vai pedir uma análise contábil para saber se há irregularidade nos pagamentos.

A Constran declarou que fez um acordo com o Governo do Maranhão para receber, a prazo e sem juros, o valor devido por uma obra realizada na década de 1980. A construtora afirmou que tomou essa medida para não atrasar, ainda mais, o pagamento da dívida. A Constran também nega ter contratado Alberto Youssef.

Fantástico mostra esquema de laranjas em prefeituras do MA

Do Fantástico

Prefeita de Anapurus e Roseana

Prefeita de Anapurus e Roseana

No início da tarde da quinta-feira (17), no interior do Maranhão, os repórteres Eduardo Faustini e Luiz Cláudio Azevedo investigavam denúncias de desvio de dinheiro público em duas cidades: Anapurus e Mata Roma, que ficam a cerca de três horas e meia de carro da capital, São Luís.

A equipe parou para almoçar em uma churrascaria, na estrada que liga os dois municípios. Depois do almoço, já no carro, os repórteres foram surpreendidos por um outro carro, que saiu da estrada e bloqueou a equipe. Três homens saltaram e apareceram mais quatro a pé.

O bando cercou os repórteres. Dois bandidos entraram no banco de trás. Os repórteres explicaram que são jornalistas da TV Globo e estavam trabalhando em uma reportagem para o Fantástico e saíram do carro, para evitar o que parecia um sequestro. Foi quando um dos homens tomou a câmera da equipe. Os ladrões fugiram em dois veículos, levando a câmera.

No início da noite, testemunhas já tinham identificado alguns dos envolvidos. “Eles são envolvidos com política. Trabalham na prefeitura. São lá de dentro”, afirmou uma delas.
Ainda na quinta-feira (18), a polícia identificou e prendeu o PM Raimundo Silva Monteles. Ele é sobrinho da prefeita de Anapurus, Tina Monteles.

“Ele confirmou que participou da ação. Diz que foi convidado para acompanhar dois ou três funcionários da prefeitura de Anapurus para se deslocar para determinado local”, afirma Zanoni Porto, comandante-geral da PM do Maranhão.

Durante todo o fim de semana, a polícia fez buscas nas cidades de Anapurus e Mata Roma, à procura dos suspeitos e do equipamento que foi roubado. As investigações continuam, e, pelas características do crime, a polícia acredita que não tenha sido somente um roubo, mas uma tentativa de interromper o trabalho dos jornalistas.

Em nota, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão se diz preocupada com ações criminosas que buscam impedir a livre atuação da imprensa na investigação de fatos de interesse público. A associação pede a apuração no caso e punição dos autores, para que a liberdade de imprensa e o o dos cidadãos à informação sejam assegurados.

Também em nota, a Abraji, Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, afirma que identificar e punir todos os responsáveis é indispensável, para que a impunidade não estimule a repetição de casos semelhantes. E o Instituto Internacional de Segurança da Imprensa, sediado em Londres pede que os agressores dos jornalistas sejam levados à Justiça.

A polícia pediu a prisão de mais três pessoas: o secretário de Finanças de Arapurus, Jairo Lisboa de Sousa; o ex-candidato a vereador Manoel Francisco Monteles Neto; e Agnaldo Henrique Alves.

Em nota, a Prefeitura de Anapurus lamenta o ocorrido e pede às autoridades que esclareçam as circunstâncias do caso.

“Com relação aos parentes, a cidade de Anapurus, quase todo mundo é parente de todo mundo. Com relação a isso não tem nenhum problema. Com relação a servidores do município envolvidos, serão responsabilizados”, diz Márcio Wendles, advogado da prefeita de Anapurus-MA.

“Quando você atenta contra uma equipe de jornalistas, você tá atentando realmente à democracia e vamos ser duros”, destaca Marcos Afonso, secretário de Segurança do Maranhão.

A denúncia sobre um esquema de laranjas que movimenta R$ 30 milhões, dinheiro público, em cidades pobres do interior do Maranhão foi o que levou os jornalistas da TV Globo a serem ameaçados e assaltados. São contratos municipais nas mãos de empresas suspeitas, muitas delas não têm sede, e nem capacidade de prestar o serviço. Mais uma vez, quem paga a conta é o cidadão comum. E o sofrimento começa na mais básica das necessidades.

“Quando eu acordo de manhã, venho para essa ponta de mato aqui fazer necessidade, xixi. Tudo pra cá”, conta a lavradora Maria Santana.

A vizinha dela teve mais sorte, aparentemente. Dona Maria mostra o banheiro construído pela Prefeitura há menos de dois anos. A pia é de plástico. “Um parafuso aqui, outro aqui. Isso aqui, qualquer coisinha quebra tudo. Nada presta aqui”, ela diz.

Mata Roma e Anapurus são cidades pequenas, cada uma com pouco menos de 16 mil habitantes. Moradores da Zona Rural sofrem com a falta de saneamento básico.

A lavradora Cristiane Teixeira nunca usou um banheiro. “Tenho 21 anos, nasci aqui e nunca usei. Nunca tomei banho de banheiro”.

Dorival Mendes Nascimento, lavrador, mora há 40 anos na região e nunca teve água em um chuveiro: “Tem que tirar água do meu poço, e agora chegou esse poço”.

Mas, para os moradores, o poço ainda não chegou de vez. “Eles apareceram para fazer esse poço, final de maio, agora de 2014. Só fizeram furar”, diz Cristiane Teixeira dos Santos, lavradora.

Nos dois municípios, essas obras são feitas com dinheiro público. Empresas negociaram nas duas cidades contratos que, somados, chegam a R$ 30 milhões.

Em Mata Roma, a construtora Santa Margarida recebeu, só em 2012, mais de R$ 2,2 milhões para abastecimento e saneamento. A proprietária é Rejânia Maria Pinheiro dos Santos. Ela se recusou a falar com o Fantástico.

Em uma rede social, Rejânia aparece em uma foto abraçando José Ári, irmão de criação dela. No papel, José Ári é dono de outra construtora, a São Lourenço, que presta serviço ao mesmo município. Também no papel, a São Lourenço é capaz de fazer perfuração e construção de poços de água.

Mas veja o que José Ári responde quando o repórter Eduardo Faustini pergunta pela empresa.

José Ári: Que empresa?
Faustini: A sua empresa, que você presta serviço.
José: Eu?
Faustini: É.
José: Eu não. Não é eu, não.
Faustini: Você não tem empresa?
José: Não.

Em seguida, ele dá outra explicação: “Eu saí há uns três meses”.

Técnicos da Controladoria-Geral da União fiscalizaram as obras feitas com dinheiro público no município. Segundo o relatório da CGU, a construtora São Lourenço, de José Ári, não está apta a executar obras ou serviço de engenharia.

Outro esquema é no aluguel de veículos para a mesma prefeitura. Segundo a CGU, as locadoras Matarromense e Abiviagens receberam, em apenas um ano, R$ 537 mil pelo serviço de transporte escolar.

No papel, Valdecy Garreto Silva é o dono da Matarromense, uma das maiores locadoras da região. A empresa também tem contratos em Anapurus.

Faustini: O senhor é o único dono dessa empresa?
Valdecy: Não, é um irmão meu que… Eu tenho um irmão meu. É só no meu nome, ela, mas ele que resolve tudo aí.
Faustini: Quanto o senhor ganha nessa empresa?
Valdecy: Eu não sei nada.

Josivan, irmão de Valdecy, foi vereador em Mata Roma e tem mais empresas de locação de veículos. Na rua que consta como endereço no registro da Matarromense, não existe empresa nenhuma, e nem casa com a numeração fornecida à junta comercial. Josivan não foi encontrado pelo Fantástico.

A outra locadora que atende à Prefeitura de Mata Roma se chama Abiviagens. Segundo a CGU, os pagamentos à empresa, de R$ 537 mil, não poderiam ter sido feitos devido a várias irregularidades. Na sede da Abiviagens, encontramos Elânia Araújo de Almeida. Ela é funcionária da Prefeitura de Mata Roma desde 2006. Mesmo assim, foi sócia do marido, Abimael Reis, quando a Abiviagens já tinha conseguido o contrato municipal.

Faustini: Você é sócia da empresa.
Elânia: Não.
Faustini: No contrato, você não está?
Elânia: Não, eu saí.
Faustini: Você ou as suas cotas pra quem?
Elânia: Foi… É outra pessoa. Parece que a filha dele.

Procurado pelo Fantástico, Abimael Reis não quis falar.

São muitos os laranjas nessa história. Mas encontramos ainda mais irregularidades.

Em Anapurus, onde a população se queixa da falta de saneamento básico, o mestre de obras que fiscaliza a construção dos banheiros diz que recebe o salário em dinheiro vivo, diretamente das mãos do secretário de Infraestrutura, Júlio Neto. “Eu recebo pelo Júlio Neto. É dinheiro “em peça” mesmo. O patrão a o dinheiro pra mim, pago meus trabalhadores. E é assim”, ele conta.

O secretário de Infraestrutura de Anaparus – MA, Júlio Neto, nega a irregularidade nos pagamentos: “Ele recebe da construtora, viu? Agora, eu vou fiscalizar. Eu tenho que fazer a minha parte como secretário”.

Ainda em Anapurus, a empresa Premier tem R$ 3 milhões em contratos para construção e manutenção de estradas e ruas. No papel, o dono é Javé Ferreira da Costa Lima. Só que ele é operário concursado da empresa de águas do estado.

Faustini: Só um minuto. Eu quero falar sobre a sua empresa. Por que você não pode falar?
Javé: Não quero falar.
Faustini: Só um instante.
Javé: Dá licença!
Faustini: eu preciso falar contigo
Javé: Não tenho nada para falar
Faustini: Eu quero falar sobre a sua empresa que presta serviço para a Prefeitura de Mata Roma.

Procurada pelo Fantástico, a prefeita de Mata Roma, Carmen Neto, não foi encontrada nem retornou recado que nossa equipe deixou na Câmara de Vereadores.

Já o advogado da prefeita Tina Monteles, de Anapurus, diz que ela não cometeu irregularidades: “Nós temos todos os processos licitatórios na maior transparência. Todas as obras estão lá”, afirma.