Produção de alimentos e autonomia, artigo de Flávio Dino

A agricultura tem ampla tradição em praticamente todos os 332 mil quilômetros quadrados do nosso estado. De acordo com a última PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o trabalho associado à produção agrícola é a principal fonte de renda do povo do Maranhão.

Apesar de toda essa importância econômica e social, a agricultura carece de apoio em nosso estado, principalmente a de produção familiar. Alguns programas federais, como o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), conseguem financiar projetos em nosso estado, que aumentam a renda do agricultor maranhense. São R$ 16 bilhões por ano em linhas de crédito para custeio, investimento e comercialização em todo o país. O governo federal também utiliza uma política de compra de produtos da agricultura familiar por um preço mínimo, via Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), que conta com R$ 300 milhões anuais.

No entanto, da parte do governo estadual, faltam ações. E o apoio à produção, que já é pequeno, só vem diminuindo. Este ano houve corte superiores a R$ 9 milhões. No dia a dia, o governo não se preocupa nem em ouvir as demandas das entidades do setor, como a Fetaema (Federação dos Trabalhadores em Agricultura do Estado do Maranhão). A agricultura empresarial também é desprezada e esquecida nas escassas politicas estaduais que ainda funcionam.
Programas estruturais, que podem contribuir para colocar a agricultura familiar em um novo patamar, estão parados ou em marcha lenta, sem que o governo do Estado tome alguma providência efetiva. Cito o exemplo do projeto Salangô, entre outros.

Temos clareza da importância central que tem a agricultura familiar para um novo modelo de desenvolvimento para o Maranhão, que haveremos de conquistar.
Aumentar a produção de alimentos em nosso estado vai reduzir a dependência de importação de produtos de outras unidades da federação, pondo fim ao vexame de o Maranhão comprar até frutas de outros estados. Além disso, pela extensão de sua presença em nosso estado e pela quantidade de pessoas que ocupa, naturalmente esta é a forma mais ágil de gerar um aumento imediato de renda para a população.

A consequência será ativar a roda da economia nos 217 municípios maranhenses, já que esse ganho de renda se transformará em gastos no comércio das cidades, com geração de empregos e novo aumento de renda, gerando um círculo virtuoso em que todos temos a ganhar. O o seguinte é avançar na industrialização do Maranhão, não só na dependência de exportações, mas com bases assentadas em um próspero mercado interno.

Uma forma rápida de estimular a agricultura familiar em nosso estado é replicar uma ideia que já obteve êxito em âmbito federal: o Programa de Aquisição de Alimentos. O próprio governo do estado é o principal consumidor potencial dos alimentos produzidos no Maranhão. Em vez de contratar empresas duvidosas, o governo do estado deve adquirir produtos da agricultura familiar para abastecer escolas, presídios e hospitais.

Além de soluções imediatas, é necessário investir muito em assistência técnica aos produtores rurais para aumentar a produtividade das plantações de mandioca, arroz, milho, frutas etc, bem como diversificar nossa produção. A assistência técnica em parceria com entes federais públicos ou privados, como Embrapa e SEBRAE, pode garantir também que os produtores agreguem valor a seus produtos, ampliando ainda mais seus ganhos.

Para que a ciência e a tecnologia se associem ao mundo da produção, as Universidades e os Institutos Federais (IFMA) têm um papel central. Com tais parcerias, o Maranhão pode avançar com inovação e alta produtividade, não só em poucos enclaves, mas em todo o nosso território.

A agricultura familiar tem todas as condições para ser o motor central de um novo modelo de desenvolvimento para o Maranhão, em que todos possam produzir e partilhar da riqueza aqui produzida. Reafirmando essa compreensão que tenho, estive nesse final de semana em um Encontro da FETAEMA e visitando o Perímetro Irrigado Tabuleiros de São Bernardo, conforme relatarei em um próximo artigo.

Presidente do Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), foi deputado federal e juiz federal

Decadência na Produção de Alimentos no Maranhão*

José Lemos

Entre os dias 22 e 25 de julho, na próxima semana, portanto, acontece em Vitoria, ES o qüinquagésimo Congresso da Sociedade Brasileira de Economia, istração e Sociologia Rural (SOBER0. Um evento anual que congrega cientistas, pesquisadores, estudantes de Ciências Agrárias do Brasil e do Exterior.

Estarei por lá apresentando um trabalho que venho realizando, já faz alguns anos, que consiste no acompanhamento anual da produção agrícola do Maranhão, notadamente a de alimentos, sobretudo aqueles cultivados pela totalidade dos agricultores familiares maranhenses: arroz, feijão, mandioca e milho.

O IBGE começou a fazer registros da produção agropecuária brasileira em 1933. Naquele ano a área contabilizada no cultivo daqueles quatro itens no Maranhão foi de 46.760 hectares, em que foram produzidas 235.305 toneladas.

O Maranhão prosseguiu produzindo alimentos numa trajetória cíclica (uma das características da produção agrícola), mas com tendência ascendente, até o começo dos anos oitenta. Em 1982 o estado alcançou o pico de 2,28 milhões de hectares colhidos com arroz, feijão, mandioca e milho. A produção foi histórica: 5,43 milhões de toneladas. A produção diária per capita de alimentos também foi a maior, desde que há registros, chegando a 3.584 gramas.

Pode-se falar tudo dos militares no poder, naquele período de exceção entre abril de 1964 e fevereiro de 1985. E há muito o que falar. Mas em sintonia com os fatos históricos, temos que registrar que foi naquele período que o setor agrícola brasileiro iniciou os caminhos que o fariam referencia mundial na produção de alimentos e de agro energia. Em 1974 foram criadas a EMBRAPA e a Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMBRATER). No Maranhão havia a Empresa Maranhense de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER) vinculada à EMBRATER.

Em março de 1985 assumiu o primeiro governo civil, após vinte anos de governos militares. Dentre tantas providencias desastradas do novo governo, uma delas foi desmantelar a EMBRATER. Por tabela, as EMATER dos estados entraram em colapso. A EMBRAPA não foi desestruturada porque já tinha prestigio internacional, inclusive porque elaborou o maior programa de treinamento de Profissionais de Ciências Agrárias que se tem noticia neste Brasil. Gerava conhecimentos que revolucionariam a produção do País.

Os estados do Sul e do Sudeste conseguiram manter o seu sistema de assistência técnica, e continuaram produzindo bem. Os do Norte e do Nordeste seguiram no ritmo do que fazia o governo Federal. No Maranhão, cujo Governador estava sintonizado ao então presidente da Republica, o descaso foi evidente. Os resultados vieram logo, numa incrível relação de causa-efeito. Em 1985 o Maranhão colheu apenas 1,8 milhões de toneladas de alimentos em 1,2 milhões de hectares. A produção diária per capita despencou para 1.122 gramas, menos de um terço do valor de 1982, que deve ser a nossa referencia mínima.

A decadência do estado continuou, até que em 1998 a governadora, que assumira o seu segundo mandato, acabou com a Secretaria de Agricultura e com todo o aparato técnico e institucional que viabilizava a produção agrícola de alimentos no Maranhão.

A relação causa-efeito se manifestou novamente de forma cristalina, expondo a incompetência istrativa daquele governo. Em 1998 o Maranhão colheu 924.488 hectares, 40% da área histórica de 1982. Naquele ano (1998) a produção diária per capita de alimentos no estado chegou ao fundo do poço, atingindo 678 gramas, apenas 23 gramas acima das 655 gramas diárias per capita de 1934.

Em abril de 2002 a Secretaria de Agricultura foi recriada, e com ela refez-se o serviço de assistência técnica, através das Casas do Agricultor Familiar (CAF). Com esta medida, o Maranhão retomou a produção de alimentos, inclusive tendo uma postura mais agressiva na captação de recursos do PRONAF, que tinha dificuldade de o por não ter Secretaria de Agricultura. Os resultados vieram num crescendo entre 2003 e 2006. Em 2006 o estado atingiu o recorde na captação de recursos do PRONAF, ficando atrás apenas da Bahia no Nordeste. A produção diária per capita de alimentos ascendeu para 1.282 gramas, ainda distante da marca histórica, mas quase o dobro do desastre de 1998.

Em 2007 as CAF foram desmontadas, e no seu lugar foi colocada uma estrutura de burocracia pesada. Em decorrência o Maranhão voltou a regredir na captação de recursos do PRONAF, caindo para a quinta posição no Nordeste, e na produção de alimentos (1.260 gramas diárias per capita). A queda evoluiu, de modo que a produção diária per capita de alimentos chegou a apenas 911 gramas em 2010. Por estas e outras razões é que o Maranhão segue com a triste marca de ser o estado recordista em carências de toda ordem.

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*Artigo publicado no dia 21-07-2012.